Como regra, a definição da responsabilidade inicia-se pelo exame de competências definidas na lei ou nas normas regimentais.
Para melhor compreensão: a organização sistêmica da Administração Pública divide as funções do serviço público e da função pública por áreas de atuação. Nessas áreas, definem-se órgãos que tem competência. Portanto, quando há uma irregularidade verifica-se o órgão competente para o serviço ou função e, a partir desse, o agente responsável.
Há duas exceções, na definição de responsabilidade:
a) usurpação de função, nesse caso a responsabilidade é imputada porque determinado agente não tendo competência, usa da função pública para a prática de ato, como se competente fosse; o mesmo pode ocorrer com o particular que usurpa a função pública, mediante fraude ou estelionato. Assim, por exemplo, o ex-prefeito que comparece a agência bancária e apropria-se de recursos públicos; ou o particular que obtém senha de servidor e desvia recursos ou emite uma passagem aérea para seu próprio proveito. Nesse caso, a regra da competência só serve para demonstrar a usurpação. O competente não atuou e, portanto, não pode ser responsabilizado, exceto se pela omissão ou desídia tiver contribuído para usurpação, como ocorreria se a prefeitura deixasse de atualizar a ficha de autógrafos na conta corrente bancária, ou o servidor permitisse, por descuido, o acesso à senha.
b) não há definição de competência. Ocorre, com alguma frequência, em unidades pequenas que as competências não sejam detalhadamente descritas. Numa pequena prefeitura, por exemplo, a Secretaria de Educação tem 20 servidores que fazem tudo, desde folha de pagamento até licitação. Nessa situação, não havendo como estabelecer a competência por um pagamento decorrente de reajuste indevido de contrato atua-se definindo a responsabilização para o escalão imediatamente superior, conforme organização sistêmica. Assim, o Secretário de Educação responde por todos os atos da Secretaria de Educação. E, é assim porque a esse caberia o dever da repartição da competência própria pelos servidores, reunindo-os em unidades com competências específicas. Citado o Secretário de Saúde, caberá a esse apontar o agente responsável direto pela prática do ato.
1.13.1.4 Indicar com precisão a competência e o agente
O Brasil não acolhe a responsabilização objetiva da pessoa jurídica ou do órgão. Também não é juridicamente correta a responsabilização objetiva de pessoa física.
A responsabilidade objetiva significa a desnecessidade de apurar a vontade do agente, ou seja o elemento subjetivo, para poder imputar a responsabilidade. A regra, portanto, em nosso país, e praticamente em toda civilização é que ninguém pode ser penalizado sem que se possa estabelecer, ainda que com indícios de prova, a vontade consciente do agente na prática do ato.
Por vezes, essa vontade, por lei pode ser presumida, como ocorre quando se coloca sob a guarda de um agente determinado bem, valor ou outra pessoa. A violação do dever de guarda de recursos públicos, por exemplo, pode gerar a responsabilização se o conjunto de indícios revelar o descumprimento de um dever legal, revelado pela negligência.
Como o ônus de provar o elemento subjetivo – a vontade, é de quem apura, e como não se tem bem definido quais casos de responsabilização podem ser de imprudência, negligência e imperícia, dolo eventual e culpa consciente, a própria sociedade é muita crítica pelo casuísmo com que o poder público e os órgãos de controle decidem.
É chegado o momento da nossa história de revelar a ciência que há por traz desse tema: a evolução das melhores teorias ítalo-germânicas e, mais recentemente, também americanas, oriundas de leading cases da Suprema Corte. E, também, deixar de julgar por preconceitos e prévios acertos políticos, ou pela “opinião publicada”, que muitas vezes é diferente de “opinião pública”. Só assim, a democracia republicana se solidifica como baluarte da convivência pacífica e progressista.
Para cumprir o 4º elemento, - indicar com precisão a competência do órgão e do agente, deve-se trabalhar em dois degraus distintos: aponta-se a competência do órgão e, no âmbito do órgão, a responsabilidade do agente.
A partir desses dois vetores, cita-se o agente para a definição do elemento subjetivo da conduta, classificado em dolo ou culpa.
Em decorrência do modelo burocrático – no sentido de burocracia de Max Weber, os atos são praticados numa série lógica, tendentes a um fim, documentando cada ato.
O trabalho de auditoria, inspeção ou simples apuração de responsabilidade deve buscar qual o agente é diretamente responsável pela omissão na prática de um ato necessário ou pela prática do ato irregular e, ainda, apontar indícios – provas circunstanciais, que sejam indicativos de dolo ou culpa.
Contrapor a competência com o ato para verificar a aderência: a apuração deve, na sequência, indicar o ato regular e confrontar a conduta regular com a irregular. É o contraponto que firma a responsabilidade. O agente deveria ter tido tal conduta e praticado tal ato, mas não o fez ou fez algo contrário ao que, pela regra de competência, deveria ter feito.
Texto adaptado do livro Manual do Ordenador de Despesas, pelo próprio autor. Manual do ordenador de despesas: à luz do novo regime fiscal / Jorge Ulisses Jacoby Fernandes.– Belo Horizonte : Fórum, 2020.
Saiba mais sobre o tema, lendo JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Tribunais de Contas do Brasil. 4. ed. Belo Horizonte, 2016; JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Tomada de Contas Especial. 7. Ed; JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Manual do Ordenador de Despesas. Belo Horizonte: Fórum e, ainda, JACOBY FERNANDES, Ana Luiza; JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses (org. e índice). Lei nº 14.133/2021: Lei de Licitações e Contratos Administrativos. A obra, que traz a nova Lei de Licitações e Contratos, a anterior e várias outras normas pertinentes, com a indicação do artigo correspondente da nova norma, conta, ainda, com mais de 10 mil verbetes no índice remissivo alfabético. Os livros estão lançados pela Editora Fórum
Foi alterado, hoje, o Decreto nº 11.219, de 5 de outubro de 2022
A Procuradoria-Geral da República dispôs sobre o procedimento preliminar e o processo de apuração
O órgão solicitou levantamento sistematizado para apresentação de plano central de gestão
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